AGÊNCIA E PODER DAS BUROCRACIAS INTERNACIONAIS: O PAPEL DO SECRETARIADO DA ONU NA INSTITUCIONALIZAÇÃO DE NORMAS
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Resumo
O presente artigo discute a agência da burocracia das Organização das Nações Unidas (ONU) na construção de um quadro de referência normativo para a elaboração de políticas e para o desempenho de atividades confiadas à organização. Do ponto de vista teórico, a discussão está apoiada, de um lado, na literatura institucionalista sociológica das Relações Internacionais, em especial no argumento de Michael Barnett e Martha Finnemore sobre a relativa autonomia das burocracias e sua capacidade de agência na construção da realidade social, por meio da institucionalização de normas e categorias que influenciam na leitura da realidade, nas questões ou problemas nela identificados e na respostas dadas a estes pelos atores, em diferentes níveis. A capacidade de influência das burocracias está associada em parte à expertise acumulada em determinadas áreas de atuação. Para compreender o desenvolvimento dessa expertise na estrutura burocrática onusiana, recorreremos também à literatura de Administração Pública Internacional (API). Sob esta perspectiva, o acúmulo de conhecimento especializado em determinadas áreas ocorre graças a uma complexa estrutura administrativa que busca operar de forma coordenada e integrada na elaboração e planejamento da ação internacional, no monitoramento e na avaliação contínua dessas ações e no aprendizado com base nas experiências em campo. Do ponto de vista empírico, a discussão se dará com base na análise do papel desempenhado pelo Secretariado da ONU no desenvolvimento das operações de paz multidimencionais. Para tanto, além da introdução e conclusão, estrutura-se o artigo em dois tópicos de desenvolvimento: primeiro, aborda-se teoricamente as burocracias como agentes no sistema internacional, detendo capacidade de influenciar a política internacional; e segundo, aplica-se os conhecimentos teóricos na observação da atuação do Secretariado da ONU na operacionalização das decisões e dos direcionamentos normativos relativos às operações de paz. Concluímos ressaltando que a compreensão das burocracias internacionais como atores relativamente autônomos permite uma reflexão crítica sobre a relevância das Organizações Internacionais na dinâmica do processo de formulação da política internacional e na construção da realidade social, especialmente no momento atual, em que a pandemia da COVID-19 vem colocando em xeque a capacidade das Organizações Internacionais de lidar com os problemas coletivos dentro das suas respectivas área de atuação.
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