O RECONHECIMENTO JURÍDICO DA INTERSECCIONALIDADE COMO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO

##plugins.themes.bootstrap3.article.main##

Carla Fernanda Zanata Soares

Resumo

O objetivo deste estudo é indicar a necessidade do reconhecimento da interseccionalidade como princípio constitucional brasileiro, admitindo que já está presente no texto constitucional no artigo 3º, inciso IV, como um objetivo fundamental da República. Busca o reconhecimento jurídico do potencial da interseccionalidade para além de uma Teoria Social Crítica e uma categoria analítica, mas como um direito antidiscriminatório expresso por um princípio constitucional. O problema é que sob a hegemonia do capital financeiro o Estado atua como um Estado de Direito financeirizado e de Coisas Inconstitucional, em que a lei está à serviço do mercado e contra o trabalho, violando de maneira generalizada os direitos humanos da classe trabalhadora heterogênea e vulnerável por conta de seus marcadores de gênero, raça, classe, sexualidade, etnia, nacionalidade, entre outros. A metodologia se apoia no método dedutivo, além da hermenêutica jurídica e da revisão bibliográfica e documental para levantamento e análise de decisões do STF, do PL nº 12/2024, de dados do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento - CEBRAP e de dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos - DIEESE, partindo de Teorias Críticas da Raça, do Estado e do Direito para entender a conjuntura de subordinação estrutural que erige a sociedade brasileira. Os resultados indicam três constatações: a) os posicionamentos recentes do STF têm, de forma recorrente, negado vigência aos direitos trabalhistas constitucionalmente garantidos; b) o PL nº 12/2024 viola direitos trabalhistas e promove a opressão de raça e de classe contra os trabalhadores de aplicativo; e c) a situação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro revela a continuidade de sua subordinação em virtude de raça, gênero e classe.

##plugins.themes.bootstrap3.article.details##

Como Citar
SOARES, C. F. Z. O RECONHECIMENTO JURÍDICO DA INTERSECCIONALIDADE COMO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO. Boletim de Conjuntura (BOCA), Boa Vista, v. 19, n. 55, p. 601–638, 2024. DOI: 10.5281/zenodo.13863733. Disponível em: https://revista.ioles.com.br/boca/index.php/revista/article/view/5552. Acesso em: 16 out. 2024.
Seção
Ensaios

Referências

ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Editora Boitempo, 2020.

ANTUNES, R. Trabalho em plataformas: regulamentação ou desregulamentação?: o exemplo da Europa. São Paulo: Editora Boitempo, 2024.

BASTOS, D. et al. “O estado de coisas inconstitucional como ativismo dialógico-estrutural para concretização de direitos fundamentais: limites para o controle judicial de políticas penitenciárias”. Direito e Paz, n. 37, 2017.

BOBBIO, N. Teoria geral do Direito. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2010.

BUENO, E. “O feminismo negro contra a injustiça epistêmica: um estudo das abordagens de Sueli Carneiro e Patricia Hill Collins”. Civitas: Revista de Ciências Sociais, vol. 24, n. 1, 2024.

CEBRAP - Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. “Mobilidade urbana e logística de entregas: um panorama sobre o trabalho de motoristas e entregadores com aplicativos”. CEBRAP [2024]. Disponível em: . Acesso em: 10/07/2024

CHESNAIS, F. A finança mundializada: raízes sociais e políticas, configuração, consequências. São Paulo: Editora Boitempo, 2005.

CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Editora Xamã, 1996.

CHESNAIS, F. Finance capital today: corporations and banks in the lasting global slump. Boston: Brill Academic Pub, 2016.

CNJ - Conselho Nacional de Justiça. Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Brasília: CNJ, 2021. Disponível em: . Acesso em: 07/05/2024.

COLLINS, P. H. Black feminist thought: knowledge, consciousness, and the politics of empowerment. Nova York: Routledge, 1981.

COLLINS, P. H.; BILGE, S. Intersectionality. Cambridge: Polity Press. 2016.

COLLINS, P. H.; BILGE, S. Inteseccionalidade. São Paulo: Editora Boitempo. 2021.

COMBAHEE RIVER COLLECTIVE. “The Combahee River Collective statement”. In: SMITH, B. (org.). Home girls: a black feminist anthology. New Jersey: Rutgers University Press, 2008.

CRENSHAW, K. W. “Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero”. Revista Estudos Feministas, vol. 10, n. 1. 2002.

CRENSHAW, K. W. “How Colorblindness Flourished in the Age of Obama”. In: CRENSHAW, K. W. et al. (orgs.). Seeing Race Again: countering colorblindness across the disciplines. Oakland: University of California Press, 2019.

CRENSHAW, K. W. “Mapping the Margins: Intersectionality, Identity Politics, and Violence Against Women of Color”. In: CRENSHAW, K. W. et al. Critical Race Theory: The Key Writings That Formed the Movement. New York: Published in the United States by The New Press, 1989.

CRENSHAW, K. W. “Unmasking Colorblindness in the Law: lessons from the formation of Critical Race Theory”. In: CRENSHAW, K. W. et al. (orgs.). Seeing Race Again: countering colorblindness across the disciplines. Oakland: University of California Press, 2019.

CRENSHAW, K. W. Demarginalizing the intersection of race and sex: a black feminist critique of discrimination doctrine, feminist theory and antiracist politics”. Chicago: University of Chicago, 1989.

CRENSHAW, K. W. On Intersectionality. New York: New Press. 2023.

DAVIS, A. “Prólogo: Gêneros, classes e raças no século XXI”. In: MARUANI, M. (org.) Trabalho, logo existo. São Paulo: Editora FGV, 2019.

DAVIS, A. Women, race and class. Nova York: Vintage Books, 1981.

DIAS, M. F. G. “Ciclos econômicos, reorganização produtiva e uberização do trabalho”. Boletim de Conjuntura (BOCA), vol. 3, n. 9, 2020.

DIAS, M. F. G. “Uberização: reflexos da precarização do trabalho no século XXI”. Boletim de Conjuntura (BOCA), vol. 4, n. 10, 2020.

DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. “Inserção das mulheres no Mercado de Trabalho”. DIEESE [2024]. Disponível em: . Acesso em: 12/02/2024.

DWORKIN, R. Levando os direitos a sério. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2010.

FERNÁNDEZ SILVA, L. A. “Interseccionalidad y psicología feminista: una apuesta por el compromiso inclusivo”. Revista Estudos Feministas, vol. 29, 2021.

FONTES, P. V. “Recognition and normative reconstruction as a theory of justice in Axel Honneth”. Cuestiones Políticas, vol. 41, n. 77, 2023.

GONÇALVES, C. L. “A Interpretação Constitucional e a Criação Judicial do Direito”. In: ROCHA, L. R. L.; CHEVITARESE, A. B. L. (coords.). Questões Atuais de Direito Constitucional. Brasília: UNICEUB, 2016.

GONZALEZ, L. Por um feminismo afro-latino-americano. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2020.

HABERMAS, J. A inclusão do outro: Estudos de teoria política. São Paulo: Editora da Unesp, 2018.

HARCOURT, B. E. Critique and Praxis: A critical philosophy of illusions, values, and action. London: Columbia University Press, 2020.

HARVEY, D. Os limites do capital. São Paulo: Editora Boitempo, 2013.

HEIKKI H; STUART-BUTTLE, T. “Recognition and respect in early modern philosophy”. British Journal for the History of Philosophy, vol. 32, n. 2, 2024.

HIRATA, H. “Gênero, classe e raça Interseccionalidade e consubstancialidade das relações sociais”. Tempo social, vol. 26, 2014.

HIRATA, H. “The Centrality of Women’s Work and the Sexual and International Division of Care Labor: Brazil, France, and Japan”. In: GUIMARÃES, N. A.; HIRATA, H. (eds.). Care and care workers: A Latin American perspective. Switzerland: Springer, 2021.

HONNETH, A. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. São Paulo: Editora 34, 2017.

JESUS, B. S. “Black Women Activists and Pan-Africanism in the Black Atlantic Diaspora: Profiles and Dialogues”. Brazilian Political Science Review, vol. 17, n. 2, 2023.

JOSIOWICZ, A. J. “El Poder de Nombrar Intelectuales Antirracistas Feministas Brasileñas en Plataformas Digitales”. Sexualidad, Salud y Sociedad, n. 39, 2023.

KERGOAT, D. “Dynamique et consubstantialité des rapports sociaux”. In: DORLIN, E. (org.). Sexe, race, classe: pour une épistémologie de la domination. Paris: Actuel Marx Confrontations, 2009.

KERGOAT, D. “Ouvriers = ouvrières? Propositions pour une articulation théorique de deux variables: sexe et classe sociale”. Critiques de l’Économie Politique, vol. 5, 1978.

KERGOAT, D. “Se battre, disent-elles… Paris, La Dispute”. In: GARDEY, D.; LOWY, I. (orgs.). Les sciences et la fabrication du masculin et du féminin. Paris: Archives Contemporaines, 2012.

LAPYDA, I. Introdução à financeirização: David Harvey, François Chesnais e o capitalismo contemporâneo. São Paulo: CEFA Editorial, 2023.

MARX, K. O Capital: crítica da economia política. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2008.

MILAZZO, M. “On the Transportability, Malleability, and Longevity of Colorblindness: reproducing White supremacy in Brazil and South Africa”. In: CRENSHAW, K. W. et al. (orgs.). Seeing Race Again: countering colorblindness across the disciplines. Oakland: University of California Press, 2019.

MOREIRA, A. B. “Está nascendo um novo líder: uberização do trabalho e mobilidade urbana no Brasil”. Boletim de Conjuntura (BOCA), vol. 8, n. 22, 2021.

PAUTZ, H. “Think Tanks and Policymaking”. Oxford Research Encyclopedia of Politics. Publicado online 2020, April 30.

PODER EXECUTIVO. Projeto de Lei n. 12, de 5 de março de 2024. Brasília: Câmara dos Deputados, 2024. Disponível em: . Acesso em: 10/07/2024.

SALAS-PORRAS, A. “American think tank networks and expert debates around the Global Financial Crisis: Keynesian insurgents against austerity defenders”. Policy and Society, vol. 37, 2018.

SENTO-SÉ, I. V. “Patriarcado e interseccionalidade: o público e o privado como ponto de convergência teórica”. Civitas: revista de Ciências Sociais, vol. 24, n. 1, 2024.

SOARES, C. F. Z. “Financeirização, estado de direito e o projeto de sociedade em curso no Brasil a partir das reformas do trabalho (2017) e da previdência (2019). Boletim de Conjuntura (BOCA), vol. 15, n. 44, 2023.

SOARES, C. F. Z.; KIELING, M. M. “Entre financeirização e reconhecimento: da violação à dignidade humana do trabalhador à degradação do meio ambiente natural pela Petrobrás”. Boletim de Conjuntura (BOCA), vol. 13, n. 37, 2023.

WEISS, R.; BUENO, W. C. “Pensar o mundo na encruzilhada: mulheres negras e a teoria social”. Civitas: Revista De Ciências Sociais, vol. 24, n. 1, 2024.

WESTERMEIER, C. “The Bank of International Settlements as a think tank for financial policy-making”. Policy and Society, vol. 37, n. 2, 2018.