POR MAIS SENTIPENSAR NA PESQUISA-AÇÃO-PARTICIPATIVA CLÍNICA EM PSICOLOGIA: RUMOS DESCOLONIAIS PARA ALÉM DO ESTUDO DE CASO

##plugins.themes.bootstrap3.article.main##

Beatriz Borges Brambilla
Edna Maria Severino Peters Kahhale

Resumo

“Eu não sou um estudo de caso!”. Nossa história como ciência e profissão, Psicologia, tem apontado um percurso contraditório e muitas vezes normativo/violento diante da produção de cuidado e de conhecimento. A clínica em Psicologia ou Psicologia Clínica possui origens e fundamentos alicerçados na disputa histórica presente nas noções de saúde e de clínica oriundas do campo médico. A soberania eurocêntrica e estadunidense em relação à clínica em Psicologia nos levou a uma perspectiva hegemônica adaptacionista, classificatória, hierarquizante e centrada num saber especializado mimetizado na figura da profissional/pesquisadora; no caso, da psicóloga. O artigo em questão, assim, é um ensaio descolonizante da concepção de pesquisa em Clínica em Psicologia, em especial, ao chamado recurso técnico-teórico, nomeado de estudo de caso. A partir de uma análise histórica sobre a própria noção de clínica, de pesquisa clínica e de estudo de caso, propõe-se um mergulho pela referência latino-americana na pesquisa-ação-participativa, a partir da ideia de sentipensar como horizonte ético, político, ontológico, epistemológico e metodológico para este fazer-saber, compreendido no bojo da noção de saber/cuidar – cuidar/saber, como um rumo do processo de pesquisa sentipensante em Psicologia. Para tanto, compreendemos como tarefa descolonizante da pesquisa clínica em Psicologia um reposicionamento da noção de estudo de caso, considerando-o um ato desuniversalizante, recorrendo às tarefas de uma Psicologia crítica  como a Psicologia Socio Histórica, potencializando a memória histórica, a desideologização e a construção de uma identidade pessoal e coletiva como caminho, tendo como autores  da pesquisa-cuidado novos agentes do processo que não apenas a pessoa que é nomeada como pesquisadora/psicóloga, rompendo com a ideia de que o estudo de caso ou a pesquisa clínica é sobre um Outro, superando a tradicional relação instrumental e pragmática posta classicamente na realização do estudo de caso clínico.          

##plugins.themes.bootstrap3.article.details##

Como Citar
BRAMBILLA, B. B.; KAHHALE, E. M. S. P. . POR MAIS SENTIPENSAR NA PESQUISA-AÇÃO-PARTICIPATIVA CLÍNICA EM PSICOLOGIA: RUMOS DESCOLONIAIS PARA ALÉM DO ESTUDO DE CASO. Boletim de Conjuntura (BOCA), Boa Vista, v. 14, n. 41, p. 175–193, 2023. DOI: 10.5281/zenodo.7920761. Disponível em: https://revista.ioles.com.br/boca/index.php/revista/article/view/1018. Acesso em: 27 abr. 2024.
Seção
Ensaios

Referências

BALLESTRIN, L. “América Latina e o giro decolonial”. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 11, 2013.

BOCK, A. M. B. “A perspectiva histórica da subjetividade: uma exigência para la psicologia atual”. Psicologia para América Latina, n. 1, 2004.

BRAMBILLA, B. B. et al. “‘A clínica entranhada’: tecituras de uma clínica sócio-histórica em psicologia”. In: SILVA, A. H. B. et al. (orgs.). Políticas e práticas de atenção social aos adoecimentos da vida contemporânea: diálogos e reflexões em pesquisas. Parnaíba: Acadêmica Editorial, 2021

BRAMBILLA, B. B.; FURTADO, O. “Consciência e Subjetividade: a práxis como alternativa à hegemonia do cinismo”. In: BRAMBILLA, B. B.; PIZA, S. (orgs.). Subjetividade e ética na América Latina: ou o cinismo e a potencialidade da práxis da libertação. Nova Petrópolis: Editora Nova Harmonia, 2016.

CANHADAS, G.; BRAMBILLA, B. B.; JARDIM, L. E. F. “Branquitude como tecnologia da saúde hegemônica”. Contradição - Revista Interdisciplinar de Ciências Humanas e Sociais, vol. 3, n. 2, 2022.

CIKARA, M.; MARTINEZ, J. E.; LEWIS JR., N. A. “Moving beyond social categories by incorporating context in social psychological theory”. Nature Reviews Psychology, vol. 1, n. 9, 2022.

DORON, R.; PAROT, F. Psicologia Clínica: Dicionário de Psicologia. São Paulo: Editora Ática, 1998.

DUTRA, E. “Considerações sobre as significações da psicologia clínica na contemporaneidade”. Estudos de Psicologia, vol. 9, n. 2, 2004

FALS BORDA, O. “Orígenes universales y retos actuales de la IAP (investigación acción participativa)”. Análisis Político, vol. 38, n. 1, 1999.

FALS BORDA, O. Acción y espacio: Autonomías en la nueva República. Bogotá: TM Editores, 2000.

FALS BORDA, O.; MONCAYO, V. M. Una sociología sentipensante para América Latina. Bogotá: Siglo del Hombre, 2009.

FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: Editora da UFBA, 2008.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2005.

FOUCAULT, M. O nascimento da clínica. trad. de Roberto Machado. São Paulo: Editora Forense, 1977.

FREUD, S. “Sobre a psicoterapia”. In: FREUD, S. Obras completas volume 7: O chiste e sua relação com o inconsciente. São Paulo: Editora Cia das Letras, 1905.

FREUD, S. “A psicoterapia da histeria”. In: FREUD, S. Estudos sobre a histeria. São Paulo: Editora Cia das Letras, 1895.

GONZÁLEZ REY, F. Subjetividade e saúde: superando a clínica da patologia. São Paulo: Editora Cortez, 2011.

GONZÁLEZ REY, F.; GOULART, D. M.; BEZERRA, M. S. “Ação profissional e subjetividade: para além do conceito de intervenção profissional na psicologia”. Educação, vol. 39, n. 4, 2016.

GROSFOGUEL, R. “Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global”. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 80, 2008.

KAHHALE, E. M. S. P.; MONTREOZOL, J. R. “A Clínica na Psicologia sócio-histórica: uma abordagem dialética”. In: TOASSA, G. et al. (orgs.). Psicologia Sócio-histórica e desigualdade social: do pensamento à práxis. Goiânia: Editora Imprensa Universitária, 2019a.

KAHHALE, E. M. S. P.; MONTREOZOL, J. R. “Práxis Clínica: A Psicoterapia Como Movimento Dialético Ante A Desigualdade Sociossexual”. Psicologia em Revista, vol. 25, n. 2, 2019b.

KAHHALE, E. M. S. P.; MONTREOZOL, J. R.; BRAMBILLA, B. B. “Sobre a prática clínica na perspectiva da psicologia sócio-histórica”. In: MOREIRA, M. I. C.; SOUSA, S. M. G. (org.). Psicologia sócio-histórica: bases epistemológicas, categorias fundamentais e intervenções psicossociais. Goiânia: Editora da PUC-Goiás, 2022.

KAHHALE, E. M. S. P.; ROSA, E. Z. “A construção de um saber crítico em psicologia”. In: BOCK, A. M. B.; GONÇALVES, M. G. M. (orgs.). A dimensão subjetiva da realidade: uma leitura sócio-histórica. São Paulo: Editora Cortez, 2009.

MALDONADO-TORRES, N. “A topologia do Ser e a geopolítica do conhecimento. Modernidade, império e colonialidade”. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 80, 2008.

MARQUES, R. “A formação do sujeito crítico: a dicotomia entre o senso comum e a criticidade”. Boletim de Conjuntura (BOCA), vol. 10, n. 28, 2022.

MARTÍN-BARÓ, I. “Hacia una psicología de la Liberación”. Psicología Sin Fronteras: Revista Electrónica de Intervención Psicosocial y Psicología Comunitaria, vol. 1, n. 2, 2006.

MBEMBE, A. “Un New Deal entre l’Europe et l’Afrique est-il possible?” Groupe D’études Géopolitiques Working Papers [2022]. Disponível em: . Acesso em: 23/04/2023.

MIGNOLO, W. D. Historias locales/diseños globales: colonialidad, conocimientos subalternos y pensamiento fronterizo. Madrid: Ediciones Akal, 2003.

MOREIRA, J. O.; ROMAGNOLI, R. C.; NEVES, E. O. “O surgimento da clínica psicológica: da prática curativa aos dispositivos de promoção da saúde”. Psicologia: Ciência e Profissão, vol. 27, 2007.

NERY, M. P.; COSTA, L. P. “A pesquisa em psicologia clínica: do indivíduo ao grupo”. Estudos de Psicologia, vol. 25, 2008.

ORTEGA, F. “Por uma ética e uma política da amizade”. In: MIRANDA, D. S. (org.). Ética e Cultura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2004.

PILLAY, S. R. “Where do Black lives matter? Coloniality, police violence, and epistemic injustices during the COVID-19 pandemic in South Africa and the US”. Psychology of Violence, vol 12, n. 4, 2022.

QUIJANO, A. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005.

SAWAIA, B. B. “O sofrimento ético-político como categoria de análise da dialética exclusão/inclusão”. In: SAWAIA, B. B. As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.

THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Editora Cortez, 2022.

TURATO, E. R. “Métodos qualitativos e quantitativos na área da saúde: definições, diferenças e seus objetos de pesquisa”. Revista de Saúde Pública, vol. 39, n. 3, 2003.